quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Da dor

A A. é pele e osso.
Uma velhinha inglesa de 68 anos, que mais parece ter 80.

Fiz noite e ela não estava bem.

Prostrada, mas reactiva a estimulação verbal. Orientada.
Normotensa. Ligada a telemetria. Traçado de base sinusal, normocárdica. Saturava a 98% com oxigénio a 3,5L/min por cânula nasal.
Os membros espásticos.
Segurou-me o braço com tanta força, quando a virei para trocar a fralda.

- A., do you need a painkiller?
- Oh. Yes, please.

Vejo a folha de terapêutica. Analgesia de resgate: paracetamol.
Ligo ao médico de urgência. Sou autorizada a dar morfina.

Limpa e posicionada. Medicação administrada.
A A. agradece e até sorri, de olhos fechados.

No quarto, há um cadeirão, onde a A. se sentava, quando estava melhor.
Cubro-o com um lençol.
Encolho-me ali. Fecho os olhos, na tentativa de amenizar o sono que se abate sobre mim depois das três da manhã.
De vinte em vinte minutos, a A. acorda. Incapaz de usar a campainha. Grita por água.

E eu dou-lhe. Copos e copos. 1900 mililitros no total.

Numa das vezes, em que ela fecha os olhos, e eu estico-me no cadeirão, penso. Morrer sem ninguém por perto deve ser muito muito triste.