terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Pequeninas, coisas pequeninas

Há um médico no meu hospital que eu odeio.
É mal-criado. É negligente. Faz visitas a correr. Não liga aos doentes. Não lhes responde objectivamente às perguntas.
Odeio. E ele odiava-me a mim também. Até ao momento em que eu aprendi a sorrir-lhe, ainda que contrariada. Rio-me para ele e isso basta para que ele passe toda a medicação que sugiro, peça análises, tudo tudo tudo!

Hoje visitou uma doente com uma gastroenterite.
Disse-lhe que a PCR estava elevada. Disse-lhe que tinha leucocitose.
A mulher, holandesa com um inglês péssimo, disse-lhe que tinha diarreia. Respondeu que ia prescrever loperamida.

Saio do quarto para ir buscar um comprimido.
Volto estava a mulher em lágrimas. Pergunto-lhe o que se passa. Ela diz que está nervosa. Fala com o marido em holandês.

Sento-me ao lado deles. Pergunto-lhe se eles estão a perceber o que se passa.
O marido responde-me so and so.

Pego num papel de limpar as mãos.
Desenho um estômago e os intestinos.
Digo, de uma forma muito simples, que o sistema digestivo está irritado. Provavelmente alguma coisa que ela comeu... Explico-lhe o que é a PCR e o que são leucócitos. Associo os valores elevados à inflamação.

Tranquilizo-os. Vai tomar a loperamida e as diarreias vão parar. Depois tem também o antibiótico. O soro para mantê-la hidratada. Vai ficar tudo bem. Nada de lágrimas!

Saio do quarto.
A mulher mais calma. O marido oferece-me 20 euros e dá-me pancadinhas nas costas enquanto sorri.

E ser enfermeira é isto.
Coisinhas pequenas que fazem tanta diferença.